O problema não se resume ao facto destas imagens revelarem aspectos de duas portas, situadas, de frente uma para a outra, na mesma rua. O problema decorre do cheiro pestilento que se sente junto delas, quer na proximidade da velha porta de madeira, quer diante da inutilizada porta de ferro, outrora forrada, na parte superior, por uma grelha envidraçada.
A porta de ferro correspondia a um daqueles lugares que se chamavam justamente «lugares» e nos quais, além de frutas e vegetais frescos, se vediam também mercearias, desde o petróleo para o fogão até ao jurássico «sabão macaco». O cheiro que vinha do fundo, da contraloja, não era muito próprio de uma loja com este perfil: porque se tratava de um «cheiro a canos», como explicavam as vizinhas, apesar do senhor António, dono do «Lugar», garantir a toda a gente que se estafava a limpar a casa de banho e a grelha que havia na cerâmica do pátio, zona a céu aberto onde se acumulavam velhos móveis, cadeiras partidas, alguidares, a casota do gato. E lixo para evacuar à noite.
A porta de madeira, muito velha, talvez mais velha do que a sua vizinha da frente, em ferro pintado, corresponde a um daquelas prédios tocados de ornatos nas cantarias, janelas simétricas, ao alto, paredes revestidas de azulejos da boa época desse gosto. Havia duas residências, simétricas relativamente à porta, e ambas, naturalmente, situadas no rés do chão. A residêndia da esquerda ficara devoluta dez anos atrás, pela morte da sua locatária, e nunca mais foi reabilitada. Do lado direito, havia também uma única locatária, com mais de oitenta anos. Embora desta outra porta, no lado oposto da rua, também cheirasse a canos, sobretudo quando era aberta, a Dona Clementina garantia, a quem a interpelasse, que podiam entrar na sua casa, estava toda lavada e não pairava por lá nenhum mau cheiro.
A porta de madeira, muito velha, talvez mais velha do que a sua vizinha da frente, em ferro pintado, corresponde a um daquelas prédios tocados de ornatos nas cantarias, janelas simétricas, ao alto, paredes revestidas de azulejos da boa época desse gosto. Havia duas residências, simétricas relativamente à porta, e ambas, naturalmente, situadas no rés do chão. A residêndia da esquerda ficara devoluta dez anos atrás, pela morte da sua locatária, e nunca mais foi reabilitada. Do lado direito, havia também uma única locatária, com mais de oitenta anos. Embora desta outra porta, no lado oposto da rua, também cheirasse a canos, sobretudo quando era aberta, a Dona Clementina garantia, a quem a interpelasse, que podiam entrar na sua casa, estava toda lavada e não pairava por lá nenhum mau cheiro.
Durante muitos anos, como á habitual entre nós, este problema ganhou a importância de catástrofe urbana, meteu delegados de saúde, polícia, tribunal, e nada se provou. O «Lugar» foi definhando e o Senhor António faliu. Desactivada a casa, sem produtos nem pessoas, continuava a contaminar a rua nas suas redondezas, pelo que foi entaipada com tijolos. Obviamente, morta a a Dona Ricardina, os netos entregaram as chaves e tudo ficou encerrado durante anos e anos. Por estranho que pareça, quando se passa ali, o cheiro é determinante na mesma e obriga-nos a ensaiar círculos de afastamento.
Hoje, diga-se o que se disser, na maior parte de prédios como estes, em várias zonas da cidade de Lisboa, o cheiro pestilento já ultrapassa esta ou aquela porta, mas na maior parte delas, imensamente, eternamente, sem a menor das compensações
2 comentários:
Como é possível que Lisboa me apareça de repente associada a maus odores?
Li esta semana sobre os ditos odores impregnados nos taxis da cidade.
Não será de se dar conta disso à ASAE?
Não tanto pelas imagens (apesar de adequadas), mas pelo fantastico texto que nos leva a visualizar na perfeição lugares de uma cidade onde a degradação, o desleixo do homem é bem patente, infelizmente ainda nos dias de hoje.
Os odores estão para ficar...
Cheira a Lisboa
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