Quando nos aproximamos dos outros parece que nos encontramos com o nosso rosto ao espelho. E, no entanto, quem nos olha de frente olha-nos sem nos reconhecer. Pode olhar-nos sem nos ver nem a si mesmo. Ser por dentro é, na verdade, recapitular instintivamente os vultos que repousam naqueles planos difusos do ser, do ser na memória, de milhares de imagens que entram e saiem em cada minuto da nossa vida e destróem ordens antigas para construir novos espaços, intrigas, planos encadeados, equívocos, derivas insanáveis na viagem maior que nos consome perante a irrecusável anunciação da morte. Mas a morte também nos visita em vida, como num filme. Vemos imagens que talvez nos perteçam, a par dos outros, com os outros, e então imaginamos estar num mundo de espelhos, quebras polidas e arestas pela colagem dos sonhos entre si. Hopkins, quando tratou este assunto, trocou as voltas ao filme, o filme da vida e o outro, trabalhando até ao limite a mistura das imagens do real com as imagens falsas do cinema. São falsas porque decorrem de pequenos frames em corrida de dominó. Dominó na própria paragem do gesto ou nos longos planos fundidos capazes de nos levarem a uma espécie de visão suicida que tantas vezes emerge afundando-se de novo, no fundo do inconsciente. Aquele deserto americano é a fábula dos nossos desertos interiores e das estepes do futuro.
0s fantasmas somos nós,
todos nós somos heterónimos
de outros,
entre carros diferentes,
semelhantes ao andarem
sobre rodas.
Vemos o que julgamos
não ver.
O homem que escreve,
ouve os soluços
de alguém que se perdeu de si.
Um tiro na têmpora e acaba-se
o mundo.
Abutres, cabeças de bonecas,
figurantes da morte,
os carros são personagens
que estimulam o prazer
e a morte.
Em boa verdade,
nunca chegam ao fim
das estradas poeirentas.
A alma da vida
passa por isso, na distância,
bonecos misteriosos
e contraditórios
de um filme.
No filme,
o que reaparece, parece,
fala do nossos inconsciente
ou das imagens
esquecidas de nós em nós.
todos nós somos heterónimos
de outros,
entre carros diferentes,
semelhantes ao andarem
sobre rodas.
Vemos o que julgamos
não ver.
O homem que escreve,
ouve os soluços
de alguém que se perdeu de si.
Um tiro na têmpora e acaba-se
o mundo.
Abutres, cabeças de bonecas,
figurantes da morte,
os carros são personagens
que estimulam o prazer
e a morte.
Em boa verdade,
nunca chegam ao fim
das estradas poeirentas.
A alma da vida
passa por isso, na distância,
bonecos misteriosos
e contraditórios
de um filme.
No filme,
o que reaparece, parece,
fala do nossos inconsciente
ou das imagens
esquecidas de nós em nós.
Um comentário:
Esta frase final «a fábula dos nossos desertos interiores e das estepes do futuro» passa uma mengagem, ainda que ténue, de esperança.
Postar um comentário