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segunda-feira, maio 26, 2008

ILUSTRAÇÃO para SEGREDOS CONVENTUAIS



Ali se encontravam, em metáfora, os corpos trucidados nas guerras de Alexandre, os membros e os torsos de primitivos cristãos massacrados e comidos pelos leões, no Coliseu de Roma, pedaços, enfim, daquela Grécia grosseiramente imitada que o velho Macedo Vieira, com benigna invenção e ciência persuasiva, nos dava a ver, numa grandeza bem longe das falas abrangentes e pitorescas de Hermano Saraiva na televisão. Naqueles fundos corredores e permissivas prateleiras, sombras envolvendo os gessos, noites entre as sombras, pombos de manhã, dali poderia retirar-se um amanhecer em Atenas. Abrir os moldes como cascas de dinossauros e revisitar concavidades de imitativas convexidades, esse era o apelo de qualquer visitante de tão complexos meios de ressuscitar os heróis e os santos, um lugar fragmentado pela grande geometria em pedra, em abóbada, lugar, também e de certa maneira, onde repousava mais de um milhar de virtuais estátuas da antiguidade clássica, muitas delas servidas no jeito de prato insubstituível nas aulas de iniciação à pintura, anos atrás. Em geral, as «pedras» amarradas por fitas flexíveis ou meras cordas, arames aqui e além, sobravam para uma inesperaa abstracção, assim entaladas nas reentrâncias sombrias, por cima das prateleiras, cemitério inenarrável de formas que se afirmavam humanas, corpos utilados, restos marcados por infinitos códigos de martírio póstumo

quinta-feira, maio 08, 2008

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estas histórias derivam de viagens que as editoras desconhecem, preferindo receitas e nomes de uma falsa segurança

segunda-feira, maio 05, 2008

AO VER ALGUNS MÁRTIRES DA TETCHENIA


Não estive lá. Não quero estar lá. Vi muitas e muitas fotografias da resistência dos habitantes da Tetchenia perante a guerra que os russos ali sustentam para garantir a sua férrea tutela sobre este país cuja identidade não cede aos bombardeamentos sistemáticos de artilharia pesada e ao sopro mortal que desce das nuvens pardas, estilhaçando bairros inteiros. Entre os resistentes, diante da sua cidade capital arrasada por completo, há sempre um remédio qualquer: tratarem dos feridos, organizarem a competência cívica, enterrarem os mortos e, na tarde de súbito silenciosa, tomarem um pouco de chá, trocando plavras, a sondar os seus corações. Numa revista americana, de belíssimo papel e luxuosa organização gráfica, deparei um dia com a imagem terrivelmente nítida de dois guerrilheiros deitados junto de uma esquina em pedra. Um dos guerrilheiros, a quem fora arrancada a perna direita, justamente abaixo do joelho, estava ali, assim, ajudando o seu companheiro. Ele sabia que o perigo não se encontrava atrás de si, mas ouviu os passos dos fotógrafos e olhou de soslaio, a cabeça voltada com certo esforço, dois olhos naturais e brilhantes como se pertencessem a outra pessoa, não a um recente mutilado, elementarmente assistido pelas suas próprias mãos. Nunca mais esqueci aqueles olhos e tudo o que pensei depois foi já dentro de mim, eu mesmo assumindo um lugar como protagonista da cena, do lado dos jornalistas, solidariamente na espera do verdadeiro termo daquele combate e daqueles homens. Pareciam cumprimentar-nos em jeito maquinal: «Ah, são vocês?»