O São João era comandado por D. Manuel de Sousa Sepúlveda, nobre fidalgo, bom cavaleiro, bom amigo a amparar os necessitados. O galeão vinha da Índia e nele viajavam também D. Leonor, esposa de Manuel de Sousa, dois filhos ainda pequenos e mais um, bastardo. A bordo seguiam também os fidalgos Pantaleão de Sá (cunhado do comandante), Tristão de Sousa, Diogo Mendes Dourado de Setúbal e Amador de Sousa. Entre os embarcados contavam-se ainda soldados de torna-viagem, o mestre, o contramestre e o piloto da nave, carpinteiros, calafates e guardiães, mulheres, aias e crianças, para além de muitos marinheiros e dos escravos em maior número. A partida verificou.se a 3 de Fevereiro de 1552, data já tardia para melhor navegação.
Por causa dos ventos ponteiros e das ruins velas que traziam, só tarde avistaram o Cabo da Boa Esperança. Manuel de Sousa pediu ao piloto, André Vaz, que se aproximasse mais de terra. A manobra foi cumprida e a perdição parecia anunciada. Foram apanhados por ventos instáveis, muito rudes, e o capitão, conferenciando com o mestre e o piloto, decide, pelos pareceres dados, seguir o conselho de arribar. Tudo se complicou, sem tempo de agir contra, a tempestade soprou furiosa, rasgando e levando velas enquanto uma vaga quebrou o leme apodrecido. Foram tomadas todas as disposições e tarefas, com as madeiras existentes a bordo procuraram fazer um novo leme. E de alguma roupa que traziam nas mercadorias tentaram remendar velas, no maior dos empenhos em chegar a Moçambique. Mas o mastro da proa estava abrindo a nau.
No dia 8 de Junho a ventania, implacável, e também a correnteza, começaram a empurrar para terra a nau já meio desgovernada, aberta e metendo água. Através de uma manchua, remadores exploram a costa e voltam para avisar da existência de uma única praia. Na deriva, quando o galeão passou em frente da praia indicada, foi lançada a âncora e baixado um batel.
Quando o vento amainou, Manuel de Sousa pediu ao mestre e ao piloto que colocassem em terra, juntamente com a sua mulher e filhos e mais vinte homens, o que foi realizado, varando as ondas e alcançando por fim a praia. Esta operação e outras mais acabaram, na réplica, por ser desmanteladas em consequência de um recrudescimento brutal dos ventos e tempestade, perdendo-se outras manchuas e com elas os marinheiros. A nau corre perigo de ser arrastada para o pego e André Vaz embarca gente num batel, salvando quarenta pessoas. Mas a confusão e os destroços lavravam tudo, arrastando náufragos e coisas e meios logísticos. Nesse meio tempo, andava Manuel de Sousa a correr pela praia, a acudir aos náufragos e a encaminhá-los para junto de uma grande fogueira que acendera, tendo em conta o muito frio próprio das terras do Natal.
Quatro horas depois, e a despeito de muitos salvados, o galeão estava desfeito e dele o mar devolvia apenas os destroços.
Por causa dos ventos ponteiros e das ruins velas que traziam, só tarde avistaram o Cabo da Boa Esperança. Manuel de Sousa pediu ao piloto, André Vaz, que se aproximasse mais de terra. A manobra foi cumprida e a perdição parecia anunciada. Foram apanhados por ventos instáveis, muito rudes, e o capitão, conferenciando com o mestre e o piloto, decide, pelos pareceres dados, seguir o conselho de arribar. Tudo se complicou, sem tempo de agir contra, a tempestade soprou furiosa, rasgando e levando velas enquanto uma vaga quebrou o leme apodrecido. Foram tomadas todas as disposições e tarefas, com as madeiras existentes a bordo procuraram fazer um novo leme. E de alguma roupa que traziam nas mercadorias tentaram remendar velas, no maior dos empenhos em chegar a Moçambique. Mas o mastro da proa estava abrindo a nau.
No dia 8 de Junho a ventania, implacável, e também a correnteza, começaram a empurrar para terra a nau já meio desgovernada, aberta e metendo água. Através de uma manchua, remadores exploram a costa e voltam para avisar da existência de uma única praia. Na deriva, quando o galeão passou em frente da praia indicada, foi lançada a âncora e baixado um batel.
Quando o vento amainou, Manuel de Sousa pediu ao mestre e ao piloto que colocassem em terra, juntamente com a sua mulher e filhos e mais vinte homens, o que foi realizado, varando as ondas e alcançando por fim a praia. Esta operação e outras mais acabaram, na réplica, por ser desmanteladas em consequência de um recrudescimento brutal dos ventos e tempestade, perdendo-se outras manchuas e com elas os marinheiros. A nau corre perigo de ser arrastada para o pego e André Vaz embarca gente num batel, salvando quarenta pessoas. Mas a confusão e os destroços lavravam tudo, arrastando náufragos e coisas e meios logísticos. Nesse meio tempo, andava Manuel de Sousa a correr pela praia, a acudir aos náufragos e a encaminhá-los para junto de uma grande fogueira que acendera, tendo em conta o muito frio próprio das terras do Natal.
Quatro horas depois, e a despeito de muitos salvados, o galeão estava desfeito e dele o mar devolvia apenas os destroços.
Tudo é feito então para manter a sobrevivência e planear os meios de arrancar em direcção a Moçambique. Era preciso ficar ali, no entanto, alguns dias. Há cafres vigiando de longe e mais tarde alguns deles aparecem por perto no intuito de trocar uma vaca por pregos. Entre eles, à distância, a recusa instala-se e acaba por gorar a troca.
Manuel de Sousa exorta os homens, pede que não o desamparem, e propõe a marcha pela costa até alcançarem o rio da aguada da Boa Paz, em direcção a Lourenço Marques.
A caminhada, durante cerca de 180 milhas, foi um grande gesto e uma terrível tragédia. Escaramuças com grupos de cafres tornam tudo mais difícil, bem como o achamento e troca de mantimentos. Portugueses e escravos, muitos eram os que morriam, por exaustão, grupos arrastados e perdendo-se, vitimados pelas feras. O filho bastardo de Manuel de Sousa também se perde, vinha às costas de um escravo, mas ninguém ousou meter-se pelo matagal e o comandante começa a desgastar-se, do corpo, da alma e do juízo. Durante dois meses e meio, ora aquela gente se metia pelo sertão em busca de comer, ora varavam rios e se fizeram ao longo do mar, subindo e descendo serras, homens e mulheres e crianças perdidos de fome e de sede. Pausas ensandecidas e compra, com dinheiro do comandante, de vasilhas com água a homens que se arriscavam as perigosas buscas. Há muitos que não voltam, talvez mortos pelos cafres e feras em deriva.
Apesar dos favores de um pequeno rei ali encontrado com o seu povo, Manuel de Sousa não acede aos conselhos de marcha, às incertezas apontadas, ameaçando os camaradas com a espada, o que nada tinha a ver com o seu habitual comportamento, compreensivo e bom.
Atacados e perdidos, os homens de Sepúlveda têm de entregar as armas aos cafres, portugueses e cafres apartados por aldeias, até ao mais grave assalto, cafres querendo as roupas. D. Leonor não se deixa despir, não quer sobreviver assim. Mas quando se vê nua, desamparada, atira-se ao
Manuel de Sousa exorta os homens, pede que não o desamparem, e propõe a marcha pela costa até alcançarem o rio da aguada da Boa Paz, em direcção a Lourenço Marques.
A caminhada, durante cerca de 180 milhas, foi um grande gesto e uma terrível tragédia. Escaramuças com grupos de cafres tornam tudo mais difícil, bem como o achamento e troca de mantimentos. Portugueses e escravos, muitos eram os que morriam, por exaustão, grupos arrastados e perdendo-se, vitimados pelas feras. O filho bastardo de Manuel de Sousa também se perde, vinha às costas de um escravo, mas ninguém ousou meter-se pelo matagal e o comandante começa a desgastar-se, do corpo, da alma e do juízo. Durante dois meses e meio, ora aquela gente se metia pelo sertão em busca de comer, ora varavam rios e se fizeram ao longo do mar, subindo e descendo serras, homens e mulheres e crianças perdidos de fome e de sede. Pausas ensandecidas e compra, com dinheiro do comandante, de vasilhas com água a homens que se arriscavam as perigosas buscas. Há muitos que não voltam, talvez mortos pelos cafres e feras em deriva.
Apesar dos favores de um pequeno rei ali encontrado com o seu povo, Manuel de Sousa não acede aos conselhos de marcha, às incertezas apontadas, ameaçando os camaradas com a espada, o que nada tinha a ver com o seu habitual comportamento, compreensivo e bom.
Atacados e perdidos, os homens de Sepúlveda têm de entregar as armas aos cafres, portugueses e cafres apartados por aldeias, até ao mais grave assalto, cafres querendo as roupas. D. Leonor não se deixa despir, não quer sobreviver assim. Mas quando se vê nua, desamparada, atira-se ao
chão, coberta pelos cabelos, e cava uma cova na areia onde se mete até à cintura. Manuel de Sousa, com a mantilha que arranca a uma velha aia cobre D. Leonor. Daí ela nunca mais sairá. Contudo, instado por ela, André Vaz aceita, com alguns homens, rumar na direcção de Moçambique e promete, se tanto conseguir, narrar esta história e alcançar recursos de socorro.
Embora meio destroçado do juízo, Manuel de Sousa ainda cuida de ir ao mato colher frutos para alimentar a esposa e os filhos. Um dia regressa e um dos meninos está morto. Enterra-o. No dia seguinte, ao regressar, encontra morta a sua esposa e o outro filho. Afasta as três escravas que choram sobre o corpo de D.Leonor e senta-se a seu lado. Com o rosto apoiado numa das mãos, sem dizer nada nem chorar, queda-se durante meia hora com os olhos postos na esposa. Depois, com a ajuda das escravas, abre uma cova na areia onde enterra D. Leonor e o filho. Levanta-se, não diz uma palavra, abala, mete-se pelos matagais adentro. Nunca mais ninguém o vê.
Esta narrativa foi colhida, abreviada e adaptada da História Trágico-Marítima, segundo a versão de Fernando Correia da Silva, em memória de uma realidade portuguesa que a bruma dos esquecimentos tem esbatido da nossa cultura. As ilustrações foram feitas digitalmente pelo autor deste blogue.
2 comentários:
Que tragédia. Que história triste. Mas, quem será sobrou para contar a história? Alguém sabe?
quem contou a historia foi um dos poucos sobreviventes que chegou a Sofála que era territorio português em africa, se nao me engano dos 600 que iam a bordosobraram pouco mais de cinco ou seis
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