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sexta-feira, agosto 29, 2008

O SOPRO DA BRISA E A MORTE DAS ÁRVORES


















Liso, seco, translúcido,
o tecido sobre a janela ainda se deixa atravessar
assim,
entre a luz e a palavra cujo sentido
nomeia a cortina, no balanço breve da brisa
a descer sobre o tapete copiado dos persas
aqui,
no lugar procurado pelo cão,
passos leves encobertos, dispersos,
cão que vem dormir vagos sonhos
no chão feito de flores e fios diversos.

Dorme, cão, respira devagar como as plantas,
sonha que é natural e verdadeira a relva desse tapete
e deixa que o teu pêlo se pareça com a lã do chão,
mal reflectindo a luz amarelada que desce da janela,
ou das cortinas e dos panos laterais,
ou do teu próprio sonho,
dessa lassidão lateral, de cão,
as pernas estendidas e a cabeça de orelhas caídas,
tombada e já sonhando novas saídas.

Nem tu sabes, cão, quantas vezes estive assim,
dormindo pela tarde fora, fingindo o real,
mal acordado depois pela cortina contra a cal,
outros panos laterais, igualmente teatrais,
pesados do sol a queimar e dos anos mais.

Morte anunciada, a deles,
dos troncos seculares, sem canais,
gigantescos e abandonados pelos pardais,
seiva seca, ramos quebrados,
jardim de bairro, recantos abafados,
dois patos, lentos e sós,
e um lago breve onde eles deslizavam, perto de nós.
Olhares divagando, doridos,
enquanto as serras cortavam os troncos feridos.

Troncos mortos antes de feridos.
Pardais mortos antes de perdidos













Um comentário:

fernanda f disse...

Lindo.