Numa primeira abordagem, manuseando o livro, aparece-nos por entre os dedos «a casa», numa obra de colagem do próprio autor, também artista plástico de créditos firmados. Ela projeta-se num infinito negro, sem horizontes, telhados assimétricos, montagem sugerindo vários edifícios desalinhados em convívio forçado, querendo parecer um só.
O primeiro contacto perdura ao longo das páginas, «a casa» emergindo da escuridão em que pousa, esplêncida na construção em colagens de persomagens a que correspondem as tonalidades de carácter dentro da mesma cor cor neutra da velhice, plantada sobre os escombros.
Pela mão da juventude -- uma personagem em recuperação de ferimentos graves, eventualmente de guerra -- se percorre o seu interior. Primeiro em cadeira de rodas, depois equilibrando-se em canadianas, aqui e além assolado por fantasmas que permaneem vivos e presentes, aterradores, também as memórias dos primeiros ensaios de jornalismo, seu avô, seu pai nas lides corticeiras, o flash dos cabelos loiros da mãe, a relação fuugaz que estabelece com uma das empregadas mais jovens da casa.
Pertinente, actual, po todo o livro perpassam referências à pintura e a leituras, preocupações, a necessidade de pasar a mensagem da denúncia de situações escusas, infelizmente repetidas sem e com democracia. Destaco a descrição de uma biblioteca fabulosa, «tábuas e papel trepando por ocultas paredes de pedra e argamassa», todo um capítulo com referências que marcaram uma geração, a alusão ao Fahrenheit 451, de Truffaut, à Guerra dos Mundos. Brilhante o final do capítulo com um livro de capa dura que sobrava sobre a mesa atulhada de jornais antigos.
É admirável a pintura do comportamento de gente em declínio, em degradação física e mental a que todos estamos sujeitos, com pinceladas de afectos, a complexidade humana numa bela escrita densa, em que perpassa hna sensibilidade atenta, ponteada da cultura que caracteriza o autor.
Jawaa
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texto de síntese publicado no Bar do Ossian a propósito de um livro do autor deste blog e cuja
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texto de síntese publicado no Bar do Ossian a propósito de um livro do autor deste blog e cuja
notícia já foi amplamente divulgada. Com uma carga de simbolismo por vezes arrasadora, a geração mais nova, traumatizada, ferida de angústia, alguém desperta para a imensidão dos espaços da Casa, imagens que lembram a impossibilidade arquitetónica do mundo e onde se acumulam sobretudo velhos, gente em tertúlia e tosses inquietantes, a morte, a demografia a decrescer, as solidões gerando perdas e olhares de suicídio, um clima, também, que nos lembra por vezes a tragédia contada por Camus em A Peste. A Casa não é Oran, não tem saída para além do bosque, perde dia a dia o seu ar institucional e as gentes, sobrando, na sua cama gélida, o narrador ferido, um jovem largos anos mais velhos, imaginando ver na moldurada redonda da lâmpada do tecto a face nocturna da lua, o Mar da Tranquilidade, em silêncio absoluto.
Sousa Carneiro
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