As razões da crítica de cinema, relativamente à qualidade deste filme, são dúbias; onde me foi possível investigar encontrei o seguinte balanço através dos símbolos das estrelas: Jorge Mourinha ●●●● Luis Oliveira ●● Vasco Câmara ●● Todos os outros intervenientes desta área dividiram os pontos nesta mesma proporção. E isso significa, pelo menos, que o filme não atinge nunca os cinco pontos e desce igual e frequentemente até às duas sinalizações. Nada que se pareça com o efeito desencadeado, a todos os níveis, pelo idêntico trabalho de Kubrick com o inesquecível «2001, Odisseia no Espaço».
A sinopse do filme pode resumir-se à seguinte situação: o planeta terra começa a perder as suas características vitais de sustentação da vida, isolando as pessoas em culturas do âmbito agrícola, devido aos problemas originados pelo vento, o pó e a fraqueza solar. Secretamente a Nasa estuda a alternativa de lançar para uma próxima galáxia, contornando a relatividade de Einstein, expedições em busca da planetas capazes de permitirem a emigração para lá da Humanidade, em fases de abertura a dados de se integrar nesses espaços e prolongar a sua persistência contra o desaparecimento.
Jorge Mourinha (crítico do “Público”) aponta desde o início que a qualidade de relojoeiro marca desde logo a natureza da obra, porque tudo tem que ser feito depressa mas a tempo e com tempo, no domínio da própria vertente do tempo, da mobilidade acima do controverso limite da velocidade da luz e da realidade do próprio espaço. A ideia de atravessar o espaço usando as potencialidades de um "buraco negro" permitirá encurtar o tempo e aproximar o espaço, emergindo numa galáxia onde, com risco, será possível estudar três planetas para lograr o transplante dos humanos para um novo habitat. Esta controversa viagem baseia-se na dinâmica propulsiva e na relação entre a matemática gravitacional e a física quântica, permitindo arriscadíssimos retornos, mesmo enfrentando a diferença dos tempos (das idades) entre quem retornasse e quem ainda pudesse estar vivo na Terra, numa diferença de cerca de 80 anos.
Todas as cenas iniciais do filme têm um acertado clima das planícies americanas, casas rasteiras em madeira castanha, pó e vento envolvendo enormes plantações de milho. Está bem climatizado, um fazendeiro que já andara pela NASA parece afrontado pela filha na ideia de participar na primeira viagem ao cosmos. Mas estas sequências, com tempestades de areia, pecam por falta de uma segunda dimensão das coisas em risco e por uma óbvia banalidade narrativa. Mas não deixa de esboçar alguma inquietude porque se pressente que o mundo vai ser, daqui para a frente, sempre assim, perdendo inclusive a capacidade de produzir os meios de subsistência.
É então, já não sei bem como, que o fazendeiro americano, lembrando um cowboy, descobre sinais de uma instalação vedada (o suspense é breve) e acabará por ser metido numas instalações secretas da NASA, onde afinal alguém o conhecia e se calhar o esperava. O cenário parece pertencer a um Thriller cujo orçamento obrigou a filmagens num armazém pardacento.●● Não há elementos de fascínio. Claro que, atrás de um portão que se abre se pode ver um foguetão Saturno, à escala, sem se ver a fuselagem superior, espirrando os fogozitos de ralenti. O fazendeiro troca impressões com o grande cientista que dirige aquilo (estereótipo de sábio velho e quem sabe se maníaco quanto à sua tese), que desvenda as novas formas de trabalhar com a gravidade, numa relação de tempo e espaço. O movimento de propulsão organiza-se em função da gravidade e das travessias pelo "buracos negros". As reuniões em torno do segredo da viagem e da sua tecnologia são a cópia de qualquer conselho do FBI na iminência de um ataque à URSS.
Só depois desta mediania se começa a ver a azáfama de carros de aeroporto, coisas de astrofísica, entrevistas. O fazendeiro acaba, a princípio com relutância (pela sua inteligente filha, pela sua inquieta mulher), de aceitar entrar na aventura. Volta a casa (como se vê, a instalação secreta da NASA estava ali à mão se semear) e defende a sua intervenção — drama sentimental e paternal, a impossível promessa à filha de que voltará.●
Daqui para a frente é o levantamento real do foguetão e da separação dos seus fragmentos, além da ejecção do módulo para a viagem. É pouco crível, e forma imagística, a súbita existência deste módulo, dentro do qual os astronautas se preparam para viajar durante dois anos até perto de Saturno, Júpiter. O arranque faz-nos passar de um silêncio espacial para o troar dos motores: o ruído é tanto que nos obriga a proteger os tímpanos. Não há proporcionalidades entre o que terá acontecido e a representação disso para uma escala mil vezes menor (espectadores).É um erro da incultura actual.●●
Para esta primeira fase os astronautas, incluindo uma mulher que nos distrai da leitura dos materiais alumínicos, espaços surdos, tubos, quase nenhum tablier ligado, os personagens metem-se nuns tanques de líquido (amniótico?) e lá ficam no nirvana, separados da vida e do tempo. Quando acordam (dois anos depois) erguem o tronco de súbito, atordoados, fingindo exactamente aquilo que acontece a quem quase se afoga no mar e tosse para expelir a água dos pulmões.●● São pormenores. Mas tais pormenores desdizem centenas de coisas em volta. Os cenários interiores das naves (parece que estamos sempre na mesma) são realistas, a imitar de forma mais pobre a balbúrdia do que acontece, por exemplo, nos salões cilíndricos da actual estação espacial. O ponto de vista para o exterior é-nos dado n vezes de um só ângulo, com o focinho da nave (o capot) apontado à frente, só por vezes assim mas a andar de lado perante uma turbulência de nuvens ou superfície planetária.● E quando estes desgraçados se aproximam do «seu» planeta a explorar, com alguma peripécias visuais mas sempre dentro de uma montagem cinematográfica em planos curtos, planos que não justificam (na soma final) as três horas do filme. Este planeta, que aparece após a travessia das nuvens, é todo um oceano. É um falhanço. «Perdemos», diz alguém. Amaravam: e nesse caso surge a primeira verdadeira imagem em que o realizador percebe que à escala do além tudo parece maior. A nave é um ponto no grande oceano; e, em homenagem aos actuais surfistas, uma grande onda, à frente de outras, pressupõe-se, obriga os homens a sair dali. A onda parece parada e, segundo as escalas, teria certamente mais de 200 metros de altura. ●●●
A legendagem portuguesa é quase ilegível para quem vê o filme da última fila, único lugar adequado para ver uma imagem com aquela escala (arquitectónica, não fílmica). Mas lá ficamos a saber que era urgente contactar com os outros módulos da missão Lázaro. Os planetas visados são o Miller, Edmunds e Mann.
Nós seguimos na nave Endurance, seguindo o sinal deixado pela missão Miller. Só que, por essa via, procura-se um planeta muito próximo do "buraco negro" Gargantua, em rotação. Essa rotação, por causa da força gravitacional, torna o tempo do planeta de destino mais lento que o da Terra. Miller, um só oceano, e incidentes, a perda de um companheiro, o encontro do que fora primeiro (Romilly). Os dados dizem que na Terra o tempo decorrido já atingira os 23 anos. Pobre Einstein. Na Terra a menina Murphy é entretanto adulta e trabalha na NASA, procurando resolver a equação do professor Brand. O homem trabalhara nisso toda a vida. Segundo se pode ler nos arquivos da Internet, ele achava que resolveria o problema de como os humanos poderiam manipular a gravidade. Ao morrer, percebeu que se enganara, que faltava um dado para achar uma singularidade gravitacional. A humanidade estava perdida. A ideia de um plano B consistia em integrar embriões humanos num outro planeta propício. Só uma bola e preta.●
Na Endurance, dado a excessiva demora da missão, a malta escolhe ir a Mann ou Edmunds. Amélia (grande plano) ●●● prefere ir a Edmunds porque está apaixonada pelo astronauta. Discute com Cooper, o fazendeiro, dizendo que ele só quer voltar à terra. (Pode?●) Cooper vence e vão para Mann. Mas os dados emitidos por Mann eram manipulados: o astronauta lá chegado procurava assim um resgate por parte dos outros. Belas imagens gélidas deste planeta, com o nome do astronauta lá chegado (Mann). Este desgraçado tenta acoplar a nave de Cooper. Embora estas imagens superem a habitual monotonia dos interiores não digitalizados, ganhando palpitação e engenho, sendo interessante o móvel de acoplagem, não passam, pela falta de uma melhor «encenação», de algo já visto. Aliás o «mau» que forçara o resgate, comprometendo muita coisa, explode. Os outros percebem tudo, sobretudo o facto daquele planeta ser mais virtual do que real. Na fuga, e para superar o efeito de Gargantua, Cooper pensa em aliviar-se de lastro e, como bom fazendeiro, descola a fase lateral onde viajava Amelia, deixando-a no maldito Mann de montanhas que flutuam sobre algo como um oceano não estável. Nesta altura, os espectadores na sala tapam os ouvidos porque o ruído da Endurance deve atingir 120 decibéis.●●●
Não vale a pena ir muito mais longe. Uma entidade extraterrestre, de cinco dimensões, ajuda Cooper a aparecer em casa de espaço aburdo. Se ali há uma quinta dimensão, porque carga de água tudo aparece, com largueza, em termos ortogonais? Cooper tenta comunicar com a filha mas flutua entre esse tempo e o tempo da sua morte. Consegue chegar à cama da figura, ambos conversam e ela manda-o embora, quando antes de partir, 80 anos atrás, lhe pedira para ficar. A cama é uma grotesca citação do filme de Kubrick, mas rodeada de uma enorme família, o que nos deixa perplexos porque estava prevista o cadenciado apagamento da humanidade. Cooper percebe que o dado faltoso na equação de Brand era o amor. O espectador pergunta-se em que termos um sentimento sem determinação quantitativa pode fechar as quantidades relacionáveis de movimento, gravidade, espaço e tempo?●●
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