Aproveitando a possibilidade de inscrever aqui, num roteiro de obras minhas de vários géneros, o antes e o depois, lembranças, a produção actual com objectos «velhos» de trinta anos, retomo a fotografia, vinte anos atrás, trabalhos em torno das velhas embarcações desactivadas, registos de natureza analógica que atestam a identidade técnica e poética deste dispositivo. Há também que salientar a propriedade específica do preto-e-branco, na ilusão de um realismo que foi trabalhado, assim, outrora, por extraordinários fotógrafos, mesmo quando a cor já invadira o mercado. Entre nós, os valores do mimetismo têm arrasado muitos meios de produção artística (e outra) na vertigem da velocidade, da compra em primeira mão. Em cinema, formatos como o 16 mm e o super 8 mm, nas suas vertentes analógicas, foram atirados ao lixo, sem alternativa de uma lateral sobrevivência, e substituídos por todas as câmaras vídeo que os técnicos inventaram, com efeitos especiais e possibilidades invulgares de trabalhar à partida a imagem, o que deveria implicar melhores critérios de roteiro e planificação, uma vez que as máquinas sugeriam a mudança de tempo e de lugar, alterações de cor, preto-e-branco, sépia e negativo, legendagem, solarização, paragem do plano, entre outras coisas. As câmaras de maior formato, que permitiam importantes índices de estabilidade, foram bem depressa substituidas por um universo de câmaras pequenas, embora capazes de realizarem o que se referiu atrás -- ou bem perto disso. E agora é o vídeo, cujos materiais de suporte se degradam a breve trecho, que começa a ser substituído pelo DVD, inclusive em gravação directa do visível para um disco integrado na câmara. Esta lógica de substituição e consumo leva-nos a ceder, por vezes em condição de reféns, à sobrecarga do imaginário com recursos banais ou domingueiros.
Há alguém que veja nas montras máquinas fotográficas de grande sofisticação, a par de um mercado de edição minimamente satisfatório? Ninguém as compra. Só digitais. Mas são coisas diferentes, como o super 8 (cinema) e o vídeo super 8 ou VHS.
Recordemos então, através destas três fotografias que o tempo atacou em parte, o tempo da óptica analógica e o impressionante realismo (mais do que se usássemos a cor) que se desprende dos ferros retorcidos de algum cargueiro já comido na sucata, ou o corpo tombado de uma barcaça construída em madeira, semelhante a essas baleias mortas que vêm dar à costa, ou ainda o resto garboso da proa de uma barco feito em madeira e lentamente desfeito lá para as curvas arenosas do Seixal.
Um comentário:
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Jorge
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