Não vejo os rostos de quem sofreu comigo
ou está sofrendo,
pedaços de quem somos, de quem são os outros,
e o tempo passando na luz crua
ou esgotando-se no sangue que escorre,
batalha de todas as idades,
Idade Média
Segunda Guerra Mundial,
Angola perdida,
Angola imensa, colossal de fecundidade e floresta,
combates menores talvez,
tiros rasteiros, tiros estalando por cima das nossas cabeças
e os bichos fugindo do desconhecido
ou grandes aves de princípio do mundo
batendo enormas asas contra a terra, o ar em breve,
lugares para ocidente na poeira que o sol alaranjava,
carros rosnando como cães malditos, a subir,
e as explosões das minas, pulsões lumínicas, brancas,
a lembrança do horror gémea da guerrilha há pouco,
há pouco as feridas e os rasgões e a retirada
para a base de campanha, ruído, candeias,
passos de corrida ou de aflição,
respostas a perguntas
e respostas em choro convulsivo,
a perna, a mão exposta, um fogo de sangue no rosto,
e a madrugada chegando no vago apaziguamento
das vítimas no horizonte
simétrico do outro,
retratos sem rosto, rasurados,
metamorfose lenta do sangue e da lama.
rocha de sousa2007
2 comentários:
Belo.
Voltei a ler. Belíssimo. Sangrento quase apocalíptico, muito visual. Terno também.
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