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sexta-feira, março 14, 2008

MENINOS LADINOS OU BONECOS DE RUA




Para quem tiver paciência de seguir esta minha deriva por obras que elaborei outrora e recentemente, acabará por verificar que a viagem de agora, das telas e desenhos de agora, ainda se apresentam marcadas pelo léxico essencial do meu «discurso gráfico-pictórico», mesmo quando as configurações se tornam mais angulares ou retornam às sinuosidades, dobras, resoluções orgânicas e fragmentárias. Este quadro é dos anos 80 e mostra um lado de «tortura», de «fingimento», de «alegria» e de «máscaras» de brincar ou amedrontar. De cima vem o contorno surdo de uma máscara exótica ou meramente doméstica: poderá tombar sobre o rosto de menino velho, enrugado, como acontece com os anões do nosso espanto, grotescos, perversos e doces, a pele em pregas como a de um homem acabado de nascer, sangrento. Noutro ponto deste roteiro, e dentro em breve numa retoma de detalhe, há quadros recentes, quadrados, onde as hastes laminares atravessam espaços de nenhum lugar e farrapos abstractos denotam, em todo o caso, uma perna amputada, a imagem instantânea de um filme de guerra. Não é possível representar o real, mas também não podemos deixar de o referir através da vida que nos agita e compromete.
Por cima desta imagem, uma outra resgatada da série dos posters, e na qual o papel amarrotado, em trompe l'oeil, inclui a síntese de uma célebre fotografia do Maio de 68. O contraste é de meios, técnicas e forma da mensagem. Mas é ainda, ou de novo, aquilo de que somos feitos enquanto testemunhas de tempos diferentes. O que somos são todas as imagens que nos atravessam.

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